Lições da Cadeia de Liberty (Élder Jeffrey R. Holland, do Quórum dos Doze Apóstolos)
Serão do SEI para Jovens Adultos • 7 de setembro de 2008 • Universidade Brigham Young
http://lds.org/broadcast/ces/CES_Sep2008_Holland_04523_059_000.pdf
Meus queridos jovens amigos, é emocionante para minha esposa e eu estarmos com vocês esta noite para esta transmissão mundial via satélite. É sempre emocionante estar no Marriott Center. Gostaria que nos fosse possível estar com vocês aí, em cada congregação, vê-los pessoalmente e poder apertar a mão de cada um. Ainda não descobrimos um modo de fazer isso usando a tecnologia, mas o nosso amor e saudação se estendem a todos vocês, não importa em que parte do mundo estejam. Apesar da vastidão de nossa audiência global, esperamos que cada um de vocês sinta individualmente o amor que lhes temos e consiga tirar de nossa mensagem de hoje algo que se aplique a sua vida pessoal.
O Profeta na Cadeia de Liberty
Uma das grandes bênçãos de nossas responsabilidades como Autoridades Gerais é a oportunidade de visitar os membros da Igreja em vários locais no mundo todo e aprender com a história vivida por eles em todo o globo. É nesse espírito que desejo falar a vocês hoje de algumas das coisas que senti na última primavera, quando fui encarregado de visitar a Estaca Platte City no oeste do Missouri, aqui nos Estados Unidos.
A Estaca Platte City Missouri fica junto à Estaca Liberty Missouri, agora tão conhecida por seu significado histórico e por englobar vários locais importantes para a história da Igreja, inclusive a Cadeia de Liberty, cujo nome é irônico (Cadeia da Liberdade). Graças ao estudo da história da Igreja, todos vocês sabem um pouco do que o Profeta Joseph Smith e outros irmãos da Igreja passaram enquanto estavam aprisionados naquele prédio durante o inverno de 1838–1839. Foi um momento terrivelmente difícil de nossa história, para a Igreja em geral, e com certeza para o próprio Profeta Joseph, que suportou o impacto da perseguição naquele período. De fato, arrisco dizer que, até seu martírio cinco anos e meio depois, não houve época mais penosa na vida de Joseph do que essa prisão cruel, ilegal e injustificada na Cadeia de Liberty.
O tempo não permite a exposição detalhada das experiências que levaram a esse momento na história da Igreja, mas basta dizer que problemas de vários tipos vinham-se acumulando desde que o Profeta Joseph recebera uma revelação em julho de 1831 apontando o Missouri como o local consagrado “para a reunião dos santos” e para a construção da “cidade de Sião” (D&C 57:1, 2). Em outubro de 1838, uma guerra total parecia inevitável entre as forças mórmons e não-mórmons que se confrontavam nessas questões. Depois de serem expulsos de vários condados do Oeste daquele Estado, e presumindo que tivessem sido convidados a discutir maneiras de serenar a situação delicada a que haviam chegado, cinco líderes da Igreja, incluindo o Profeta Joseph, marcharam sob uma bandeira de trégua, e aproximaram-se do acampamento da milícia do Missouri perto do pequeno povoado de Far West, no Condado de Caldwell.
A bandeira de trégua acabou não surtindo nenhum efeito, e os líderes da Igreja foram imediatamente acorrentados e postos sob severa vigilância. Na manhã seguinte a essa prisão, mais dois líderes da Igreja, inclusive o irmão do Profeta, Hyrum, foram levados como prisioneiros, perfazendo um total de sete presos.
A injustiça evoluiu rapidamente para uma possível tragédia quando um “tribunal” militar convocado por oficiais da milícia determinou que Joseph Smith e os outros seis prisioneiros fossem levados à praça pública de Far West e fossem sumariamente fuzilados. O General de Brigada Alexander Doniphan, oficial das forças do Missouri, terá eternamente em seu crédito o fato de que arrojada e corajosamente recusou-se a cumprir a ordem desumana e injustificável. Numa atitude ousada que poderia tê-lo levado à corte marcial, ele bradou contra o oficial comandante: “Isso é assassinato a sangue frio. Não cumprirei sua ordem. (…) E se o senhor executar esses homens, vou levá-lo a responder por isso perante um tribunal terreno, juro por Deus!”1
Ao mostrar tal coragem e integridade, Doniphan não apenas salvou a vida daqueles sete homens como também tornou-se para sempre caro aos santos dos últimos dias de todas as gerações.
Afastada a possibilidade de execução, aqueles sete homens foram obrigados a marchar a pé de Far West até Independence, e depois de Independence a Richmond. Parley P. Pratt foi enviado de volta ao condado de Daviess, que ficava perto, e os outros seis prisioneiros, inclusive Joseph e Hyrum, foram enviados a Liberty, a sede do condado vizinho, o condado de Clay, para ali aguardarem o julgamento que seria na primavera seguinte. Eles chegaram a Liberty em 1º de dezembro de 1838, pouco antes do começo do inverno.
A cadeia, uma das poucas estruturas do tipo naquela região, e com certeza uma das mais sinistras, era considerada à prova de fuga, e provavelmente era mesmo. Tinha dois andares. O andar superior dava acesso ao mundo exterior por uma única porta, pequena e pesada. No centro daquele andar havia um alçapão pelo qual os prisioneiros eram então baixados até o piso inferior ou masmorra. As paredes externas da prisão eram de pedra calcária toscamente cortada, com paredes internas de troncos de carvalho com 30 cm de espessura. Essas duas paredes eram separadas por um espaço de 30 cm preenchido com pedras soltas. Juntas, essas paredes formavam uma barreira formidável e virtualmente impenetrável, com 1,22 m de espessura.
Na masmorra, a altura do chão ao teto mal chegava a um metro e oitenta, e como alguns dos homens, inclusive o Profeta Joseph, tinham mais de um metro e oitenta de altura, isso significava que, quando em pé, tinham que ficar constantemente curvados, e quando se deitavam, a maior parte do tempo era sobre as pedras rústicas e nuas do chão da prisão, cobertas aqui e ali com um pouco de palha solta e suja ou às vezes uma esteira de palha suja.
A comida que davam aos prisioneiros era péssima e por vezes contaminada, tão imunda que um deles disse que não conseguiam comê-la até serem obrigados pela fome mais extrema.2 Em nada menos que quatro ocasiões, deram-lhes comida envenenada, fazendo com que ficassem tão extremamente doentes que passavam dias entre o vômito e uma espécie de delírio, sem ao menos se importarem se viveriam ou morreriam. Nas cartas do Profeta Joseph, ele se referiu à cadeia como sendo um “inferno, rodeado de demônios (...) onde tudo o que ouvimos são impropérios blasfemos e onde somos obrigados a testemunhar cenas de blasfêmia, bebedice, hipocrisia e deboches de todo tipo”.3 “Não temos (…) cobertores suficientes para nos aquecer”, comentou, “e quando fazemos fogo, somos obrigados a suportar a fumaça quase o tempo todo”.4 “Nossa alma está prostrada”5 e “meus nervos tremem por causa do longo confinamento”.6 “Nem a pena, nem a língua, nem os anjos”, escreveu Joseph, poderiam descrever fielmente “a malevolência infernal” que ele sofreu ali.7 E tudo isso ocorreu durante o que, em alguns relatos, foi considerado o inverno mais frio já registrado no Estado do Missouri até então.
Meu propósito não é fazer deste discurso uma ocasião para falar da dor e das dificuldades que esses homens enfrentaram na Cadeia de Liberty; assim, deixem-me pôr algumas fotos na tela e concluir essa breve parte introdutória da minha mensagem. Garanto que tenho algo mais em mente para dizer.
Eis uma foto da cadeia ainda bem semelhante ao que era na época em que Joseph e aqueles irmãos foram ali encarcerados.
Aqui está uma foto tirada alguns anos depois, quando líderes e historiadores da Igreja visitaram o local. Não sei se aquela pessoa no alto está tentando sair ou entrar.
Esta é uma seção transversal da reconstrução da prisão, feita pela Igreja, e que pode agora ser vista em nosso centro de visitantes. Observem a disposição em dois andares com uma corda e um balde, a única ligação entre a masmorra e o piso superior.
Eis aqui uma pintura de Liz Lemon Swindle mostrando Joseph em oração. Percebam a expressão desolada e suplicante no rosto de Joseph.
E aqui está uma representação feita por Greg Olsen mostrando como Joseph talvez tenha escrito algumas das revelações que recebeu na prisão.
E esta é a última foto, que me leva à verdadeira mensagem que vim dar esta noite.
Uma Experiência num Templo-Prisão
A maioria de nós, a maior parte do tempo fala sobre o edifício em Liberty imaginando uma “cadeia” ou “prisão” — e com certeza era isso. Porém, o Élder Brigham H. Roberts, ao registrar a história da Igreja, falou do local como se fosse um templo, ou mais precisamente um “templo-prisão”.8 O Élder Neal A. Maxwell usou a mesma fraseologia em alguns de seus escritos.9 Certamente faltava ao edifício a pureza, a beleza, o conforto e a limpeza de nossos verdadeiros templos, nossos templos dedicados. O palavreado e o comportamento dos guardas e criminosos que ali entravam não se assemelhavam em nada ao que vemos nos templos. De fato, a brutalidade restritiva e a injustiça do que houve em Liberty fariam com que parecesse a própria antítese do espírito de libertação e misericórdia de nossos templos e das ordenanças neles realizadas. Então, em que sentido a Cadeia de Liberty poderia ser chamada de “templo” — ou ao menos um tipo de templo — no desenvolvimento pessoal de Joseph Smith e de seu papel como profeta? E o que esse título nos diz sobre o amor e os ensinamentos de Deus, inclusive sobre onde e quando esse amor e ensinamentos são manifestados?
Ao pensarmos sobre essas coisas, será que percebemos que as experiências espirituais, experiências reveladoras e experiências sagradas podem acontecer a todos nós em todos os muitos e variados estágios e situações de nossa vida se as desejarmos, se ficarmos firmes e continuarmos a orar, e se mantivermos a fé forte durante as dificuldades? Amamos e prezamos nossos templos dedicados e as ordenanças essenciais e exaltadoras que ali são realizadas. Damos graças aos céus e aos irmãos que presidem a Igreja e por esses templos estarem sendo construídos em números crescentes, dando mais acesso a eles um número cada vez maior de membros. Eles são verdadeiramente os edifícios mais sagrados do reino de Deus, aos quais devemos ir com a maior pureza e freqüência possíveis.
Porém, a mensagem desta noite é que, quando precisarmos, podemos ter experiências sagradas, reveladoras e profundamente instrutivas com o Senhor em qualquer situação em que estejamos. Na verdade, permitam-me dizer isso de um modo um pouco mais enfático: Podemos ter experiências sagradas, reveladoras e profundamente instrutivas com o Senhor nos momentos mais angustiantes da vida — nos piores lugares, ao sofrer as injustiças mais dolorosas, ao enfrentar os reveses e a oposição mais insuperáveis que jamais enfrentamos.
Agora, falemos dessas afirmações por um instante. Cada um de nós, de um modo ou de outro, grandioso ou pequeno, extraordinário ou ocasional, vai passar algum tempo na Cadeia de Liberty — espiritualmente falando. Enfrentaremos coisas que não queremos enfrentar e que talvez nem tenham acontecido por culpa nossa. Na verdade, talvez enfrentemos situações difíceis por causa de atitudes absolutamente corretas de nossa parte, exatamente por tentarmos guardar os mandamentos do Senhor. Talvez tenhamos que enfrentar perseguição; talvez tenhamos que suportar a tristeza e a separação de entes queridos, ou fome, frio e desconsolo. Sim, antes que a vida chegue ao fim talvez todos tenhamos que experimentar um pouquinho do que os profetas muitas vezes enfrentaram; mas as lições do inverno de 1838–1839 nos ensinam que toda experiência pode transformar-se numa experiência redentora se permanecermos ligados ao Pai Celestial durante essa dificuldade. Essas difíceis lições nos ensinam que os momentos excruciantes para o homem são oportunidades para Deus, e que se formos humildes e fiéis, se crermos e não amaldiçoarmos a Deus por nossos problemas, Ele pode transformar as prisões injustas, desumanas e debilitantes de nossa vida em templos — ou pelo menos em algo que traga consolo e revelação, a companhia divina e a paz.
Vou levar o conceito um pouco mais além. Acabo de dizer que tempos difíceis podem surgir para nós. O Presidente Joseph Fielding Smith, sobrinho-neto do Profeta Joseph e neto de Hyrum, que também foi encarcerado, disse algo ainda mais incisivo quando dedicou o Centro de Visitantes da Cadeia de Liberty em 1963. Aludindo ao tipo de história que examinamos esta noite e diante do cenário em que seu avô e tio-avô foram mantidos tão injustamente, ele disse que talvez tais coisas tenham que acontecer — não só que podem, mas que tenham que acontecer. Disse ele: “Ao ler a história daqueles dias, dos dias anteriores e dos dias que se sucederam, cheguei à conclusão de que as provações, a perseguição, a oposição quase universal [contra a Igreja naquela época] foram necessárias. Seja como for, por meio delas nosso povo aprendeu muito e elas ajudaram a fortalecê-[lo]”.10
Lições da Cadeia de Liberty
Bem, sem tentar determinar quais desses tipos de experiências na vida são “obrigatórios” e quais são “opcionais”, mas ainda para o nosso bem, permitam-me mencionar umas poucas lições aprendidas em Liberty — experiências que “ensinaram” muito a Joseph e que podem ensinar a nós também, experiências que contribuem tanto para nossa formação na mortalidade como para nossa exaltação na eternidade.
Ao escolher essas lições, assinalo ainda um outro tipo de bênção que resultou daquela adversidade. Para salientar o que desejo em minha mensagem a vocês, busquei as palavras exatas que saíram dos lábios de Joseph Smith durante aquela época dolorosa, palavras agora canonizadas como escritura sagrada em Doutrina e Convênios. Não sei se devemos ter uma escritura favorita. Eu tenho tantas que vocês não conseguirão reduzir-me a uma ou duas; mas com certeza qualquer lista das minhas escrituras favoritas teria que incluir aquelas escritas nas trevas da Cadeia de Liberty.
Então, o que aprendemos instantaneamente é que Deus não ensinou apenas a Joseph Smith naquelas circunstâncias, na prisão, mas que Ele ensinou a todos nós, e as gerações futuras. Que dádiva escriturística! E que alto preço foi pago por ela! Mas que vazia seria a vida para nós, santos dos últimos dias, se não tivéssemos as seções 121, 122 e 123 de Doutrina e Convênios. Se alguém não as leu recentemente, quero que as leia hoje à noite ou o mais tardar amanhã, não depois. Essa é a sua lição de casa e eu vou cobrá-la de vocês! No total, elas estão contidas em apenas sete páginas de texto, mas essas sete páginas tocarão seu coração com sua beleza e força, e lembrarão a vocês que Deus muitas vezes “age de maneiras misteriosas para realizar Suas maravilhas”.11 De qualquer modo, Ele certamente transformou a adversidade em bênção ao nos dar esses escritos e reflexões sagrados, tão puros, nobres e cristãos tanto no tom como no conteúdo, apesar de produzidos num ambiente tão impuro, vil e destituído de Cristo.
1. Todos Têm de Enfrentar Provações
Portanto, temos três lições da Cadeia de Liberty: Considero a primeira delas inerente ao que eu já disse: que todos, inclusive (e talvez principalmente) os justos, terão de enfrentar provações. Quando isso acontece, às vezes tememos que Deus nos tenha abandonado e talvez, ao menos por um tempo, fiquemos a nos perguntar se nossos problemas um dia cessarão. Individualmente, em família, como comunidade ou como nação, provavelmente todos já tiveram ou terão a oportunidade de sentirem o que Joseph Smith sentiu quando perguntou o porquê de tamanha dor e quanto tempo as trevas e o infortúnio durariam. Nós nos identificamos com ele quando brada das profundezas e do desânimo de seu confinamento: “Ó Deus, onde estás? (...) Até quando tua mão será retida? (…) Sim, ó Senhor, até quando [teu povo suportará essas coisas] (...) antes que (...) tuas entranhas deles se compadeçam?” (D&C 121:1–3.)
Essa é uma súplica dolorosa e pessoal, vinda do coração, uma solidão espiritual que possivelmente todos viremos a sentir em algum momento de nossa vida.
Talvez vocês já tenham passado por momentos assim mesmo sendo tão jovens. Se for o caso, espero que não tenham sido muitos, mas sempre que esses momentos extremos ocorrerem, não devemos sucumbir ao temor de que Deus nos tenha abandonado ou de que Ele não ouça nossas orações. Ele ouve, sim. Ele vê, sim. Ele nos ama, sim. Quando estamos em circunstâncias terríveis e desejamos bradar “Onde estás?”, é imperativo que nos lembremos que Ele está bem ali conosco — onde sempre esteve! Precisamos continuar a acreditar, continuar a ter fé, continuar a orar e a suplicar ao céu mesmo que sintamos por algum tempo que nossas orações não são ouvidas e que Deus de algum modo se ausentou. Ele está presente. Nossas orações são ouvidas e, quando choramos, Ele e os anjos do céu choram conosco.
Nos momentos de solidão, abandono e grandes dificuldades, temos que suportar, continuar, persistir. Essa foi a mensagem do Salvador na parábola da viúva persistente (ver Lucas 18:1–8; ver também Lucas 11:5–10). Continue a bater na porta. Continue a suplicar. Enquanto isso, saiba que Deus ouve suas súplicas e conhece suas aflições. Ele é seu Pai e você é Seu filho espiritual.
Quando o que tiver de acontecer tiver acontecido e as lições a se aprender forem aprendidas, será conosco assim como foi com o Profeta Joseph. Foi exatamente no momento em que ele se sentiu mais solitário e como se os céus não o ouvissem que recebeu a ministração maravilhosa do Espírito, assim como maravilhosas e gloriosas respostas que vieram do Pai Celestial. Naquela prisão sombria e num momento deprimente, a voz do Senhor veio a ele, dizendo:
“Meu filho, paz seja com tua alma; tua adversidade e tuas aflições não durarão mais que um momento;
E então, se as suportares bem, Deus te exaltará no alto; triunfarás sobre todos os teus inimigos” (D&C 121:7–8).
Mesmo que situações aparentemente injustas se abatam sobre nós e até nos sejam feitas coisas cruéis e imerecidas — talvez por aqueles que consideramos inimigos, mas também, em alguns casos, por aqueles que pensávamos ser nossos amigos — mesmo assim, em meio a tudo isso, Deus está conosco. É por isso que pedimos que o nosso excelente coro cantasse esta noite o antigo e tradicional hino cristão de Sarah Adams, “Mais Perto Quero Estar”, inclusive com a quarta estrofe, raramente cantada, que eles apresentaram de maneira tão bela:
De minhas provações
farei Betel,
e de minhas aflições o caminho
que me levará para mais perto de Ti.12
Não estamos sozinhos em nossas pequenas prisões aqui. Quando sofremos, de fato talvez estejamos mais próximos de Deus do que jamais estivemos em toda a vida. Esse conhecimento pode tornar cada situação dessas em um templo, por assim dizer.
Com relação a nossa jornada terrena, o Senhor prometeu: “Irei adiante de vós. Estarei a vossa direita e a vossa esquerda e meu Espírito estará em vosso coração e meus anjos ao vosso redor para vos suster” (D&C 84:88). Essa é uma declaração eterna do amor e cuidado do Senhor por nós, inclusive — ou talvez especialmente — nos momentos difíceis.
2. Até os Justos Sofrerão
Em segundo lugar, temos que nos dar conta de que simplesmente por acontecerem coisas difíceis — às vezes injustas e aparentemente injustificadas — isso não significa que somos iníquos ou indignos das bênçãos nem que Deus está decepcionado conosco. É claro que o pecado traz sofrimento e que a única solução para esse comportamento é o arrependimento. Porém, às vezes o sofrimento vem aos que são retos, também. Vocês devem lembrar-se de que, em meio aos tormentos sofridos na Cadeia de Liberty, foi dito a Joseph que ele fora realmente “[lançado] em dificuldades”, tinha passado por provações e sido acusado falsamente, e fora arrancado do seio da família e lançado na prisão, à mercê de assassinos, mas que, a despeito de tudo isso, devia lembrar-se de que o mesmo havia acontecido ao Salvador do mundo, e que por Ele ter saído triunfante, nós também triunfaremos (ver D&C 122:4–7). Ao nos relembrar com sobriedade o que o Salvador teve que passar, a revelação da Cadeia de Liberty registra: “O Filho do Homem desceu abaixo de todas elas. És tu maior do que ele?” (D&C 122:8).
Não. Joseph Smith não era maior que o Salvador e nós também não somos; e quando prometemos seguir o Salvador, seguir Seus passos e ser Seus discípulos, prometemos ir aonde esse caminho divino nos levar. E o caminho da salvação sempre passou, de um jeito ou de outro, pelo Getsêmani. Assim, se o Salvador enfrentou tamanha injustiça e desalento, tamanhas perseguições, iniqüidades e sofrimento, não podemos esperar não ter que enfrentar um pouco dessas coisas se ainda quisermos ser chamados de Seus verdadeiros discípulos e fiéis seguidores. E isso com certeza destaca o fato de que os justos — no caso do Salvador a personificação da retidão — podem ser completamente puros perante Deus e ainda assim sofrer.
De fato, deve ser um grande consolo doutrinário para nós saber que Jesus, durante a Expiação, passou por todos os sofrimentos e tristezas, todas as decepções e injustiças que toda a família humana já sofrera ou ainda iria sofrer, desde Adão e Eva até o fim do mundo, para que não tivéssemos que enfrentá-los de modo tão severo ou tão intenso. Por mais pesado que seja o nosso fardo, ele seria muito mais pesado se o Salvador não tivesse passado por isso antes de nós e suportado esse fardo conosco e por nós.
Logo no início do ministério do Profeta Joseph, o Salvador ensinou a ele essa doutrina. Depois de falar de sofrimentos tão intensos e tão difíceis de suportar, Jesus disse: “Eu, Deus, sofri essas coisas por todos, para que [e isso significa vocês, eu, todos nós] não precisem sofrer caso se arrependam” (D&C 19:16). Em nossos momentos de dor e provação, acho que tremeríamos em pensar que poderia ser pior, mas a resposta a isso claramente é que poderia ser pior e seria pior. Apenas por meio de nossa fé, arrependimento e obediência ao evangelho que proporcionou a sagrada Expiação é que não é pior.
Além disso, observamos que não só o Salvador sofreu, e no caso Dele sendo completamente inocente, mas também a maioria dos profetas e os outros grandes homens e mulheres citados nas escrituras. Diga o nome de um profeta do Velho Testamento ou do Livro de Mórmon, de um apóstolo do Novo Testamento, e de praticamente qualquer líder de qualquer dispensação, inclusive a sua própria, e você estará dizendo o nome de alguém que enfrentou ou enfrenta problemas.
O que quero dizer com isso? Se você está tendo um dia ruim, está longe de ser o único — e está em muito boa companhia. Na companhia das melhores pessoas que jamais viveram.
Agora, não entendam mal. Não temos que procurar tristezas. Não temos que tentar ser mártires. Os problemas conseguem sempre nos encontrar mesmo que não os procuremos, mas, quando for óbvio que terão de enfrentar algum tempo na Cadeia de Liberty (espiritualmente falando), lembrem-se destas duas primeiras verdades ensinadas a Joseph naquele templo-prisão: Primeira, Deus não os esqueceu e segunda, o Salvador passou pelo que vocês estão passando, e isso permitiu que Ele lhes proporcionasse libertação e consolo.
Como escreveu o profeta Isaías: “nas palmas de [Suas] mãos” o Senhor os gravou, escritos permanentemente bem ali, em tecido cicatrizado, em que pregos romanos foram o instrumento de escrita. Tendo pago com sofrimento o preço que pagaram por vocês, o Pai e o Filho nunca os esquecerão ou abandonarão em seu sofrimento (ver Isaías 49:14–16; ver também 1 Néfi 21:14–16). Eles planejaram, prepararam e garantiram sua vitória se vocês a desejarem, então acreditem e “suportem bem” (D&C 121:8). No final, essas coisas “serão para o [seu] bem” (D&C 122:7) e verão um “domínio eterno” fluir para vocês para sempre “sem ser compelido” (D&C 121:46).
3. Continuem a Ser Calmos, Pacientes, Caridosos e Dispostos a Perdoar
Em terceiro lugar, e por último hoje, quero lembrar que, em meio a essas aflições, quando poderíamos sentir-nos justificados a ficar com raiva, desejar vingança, querer retribuir olho por olho e dente por dente, do templo-prisão da Cadeia de Liberty o Senhor nos relembra que “os direitos do sacerdócio são inseparavelmente ligados com os poderes do céu e que os poderes do céu não podem ser controlados nem exercidos a não ser de acordo com os princípios da retidão” (D&C 121:36). Portanto, mesmo quando enfrentamos essas circunstâncias aflitivas na vida e existe algo em nós que deseja atacar a Deus ou ao homem, seja amigo ou inimigo, precisamos lembrar-nos que “nenhum poder ou influência pode ou deve ser mantido (...) a não ser com persuasão, com longanimidade, com brandura e mansidão e com amor não fingido; (...) sem hipocrisia e sem dolo” (D&C 121:41–42; grifo do autor).
Para mim, sempre foi um testemunho extraordinário da grandiosidade do Profeta Joseph e de todos os nossos profetas, inclusive e especialmente do Salvador do mundo em Sua magnificência, o fato de que em meio a essas aflições e dificuldades eles fossem capazes de permanecer calmos e pacientes, caridosos e dispostos a perdoar — e que fossem capazes de até falar dessa maneira e, principalmente, viver dessa maneira. Mas eram capazes e foi isso o que fizeram. Eles lembraram-se de seus convênios, disciplinaram-se, e sabiam que precisamos viver o evangelho em todos os momentos, e não só quando nos é conveniente e quando as coisas vão bem. De fato, sabiam que a verdadeira prova de nossa fé e de nossa condição de discípulos de Cristo acontece quando as coisas não estão tranqüilas. É nesses momentos que vemos do que somos feitos e quão firme realmente é nosso compromisso com o evangelho.
Com certeza, o exemplo clássico disso é que nas horas mais dolorosas da Crucificação, o Salvador conseguiu dizer: “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem” (Lucas 23:34). Isso é algo difícil de pedir quando estamos sofrendo. É algo difícil de fazer quando fomos ofendidos ou estamos cansados, esgotados, ou sofrendo sem merecer, mas é aí que o comportamento cristão pode ser mais importante ainda. Lembrem-se, “os poderes do céu não podem ser controlados nem exercidos a não ser de acordo com os princípios da retidão”. E como precisamos dos poderes do céu conosco nessas horas! Como Joseph aprendeu naquele templo-prisão, mesmo na aflição e dor precisamos deixar “que [nossas] entranhas (...) sejam cheias de caridade para com todos os homens (...); então [e somente então nossa] confiança se fortalecerá na presença de Deus; e (...) o Espírito Santo será [nosso] companheiro constante” (D&C 121:45–46).
Permanecer fiéis aos nossos princípios cristãos é a única maneira pela qual a influência divina pode-nos ajudar. O Espírito tem uma tarefa quase impossível de realizar para penetrar um coração cheio de ódio, raiva, vingança ou autocomiseração. Essas coisas são todas antagônicas ao Espírito do Senhor. Por outro lado, o Espírito encontra acesso imediato a um coração que se esforça para ser caridoso e disposto a perdoar, longânimo e bondoso — princípios do verdadeiro discipulado. Que testemunho é saber que os princípios do evangelho podem ser aplicados o tempo todo e em todas as circunstâncias, e que se nos esforçarmos em permanecer fiéis, o triunfo de uma vida cristã nunca será abatido, não importa quão terrível seja a situação! Como me é cara a majestade desses ensinamentos belos e celestiais, ministrados, ironicamente, numa ocasião e em circunstâncias tão detestáveis.
Fazer Todas as Coisas com Alegria
Para encerrar as lições da Cadeia de Liberty, menciono o último versículo da última dessas três seções que examinamos esta noite. Nessa declaração canonizada final da experiência na Cadeia de Liberty, o Senhor diz a nós, por intermédio de Seu profeta, Joseph Smith: “Portanto, amados irmãos [e irmãs]”, até quando estivermos atravessando os tempos mais espinhosos, “façamos alegremente todas as coisas que estiverem a nosso alcance; e depois aguardemos, com extrema segurança, para ver a salvação de Deus e a revelação de seu braço” (D&C 123:17; grifo do autor).
Que declaração final extraordinariamente otimista e fiel feita em um templo-prisão! Quando escreveu essas palavras, Joseph não sabia quando seria libertado ou se chegaria a ser libertado. Tudo indicava que seus inimigos ainda planejavam tirar-lhe a vida. Além disso, sua esposa e seus filhos estavam sozinhos, atemorizados, passando fome muitas vezes e perguntando-se como iriam sustentar-se sem o marido e pai. Os santos, também, estavam sem lugar para morar e sem seu profeta. Estavam saindo do Missouri, rumo a Illinois, mas quem poderia dizer que tragédias os aguardavam ali? Com certeza, repito, esse foi um momento sombrio e tenebroso ao extremo.
Ainda assim, naquelas horas frias e solitárias, Joseph disse: façamos tudo o que pudermos e façamos com alegria. Depois disso, estaremos justificados em voltar-nos ao Senhor, confiar em Sua misericórdia e ver Seu braço ser revelado em nosso benefício.
Que atitude magnífica a ser adotada nos bons e maus momentos, no sofrimento ou na alegria!
Bênção e Testemunho
Meus queridos jovens amigos, como parte de meu testemunho final a vocês esta noite, quero dar-lhes uma bênção. Tenho a impressão de que, quando levamos nosso testemunho apostólico ao mundo, temos duas oportunidades e, de fato, talvez duas obrigações. Uma é a de testificar — como tentei fazer aqui e como farei antes de terminar. A outra é a de abençoar — como fizeram os apóstolos antigos quando o Salvador os convidou a fazer o mesmo que Ele fizera, só que no mundo todo.
Assim, a todos vocês presentes hoje, aqui neste grande auditório ou em outros locais no mundo todo: Eu os abençôo. Abençôo a cada um em suas circunstâncias pessoais, como se minhas mãos estivessem sobre sua cabeça. Isso lhes ofereço com a mesma honestidade com que lhes presto meu testemunho. Eu os abençôo em nome do Senhor e digo que Deus realmente os ama, ouve suas orações, está a seu lado e nunca os abandonará.
Abençôo os homens para que vocês — para que nós — sejamos dignos do sacerdócio que portamos, que sejamos fiéis à vida de discípulos para a qual fomos chamados nesta grande ordem do Santo Sacerdócio Segundo a Ordem do Filho de Deus. Eu os abençôo para que sejamos verdadeiramente semelhantes ao Mestre — que sejamos mais semelhantes a Ele no modo de pensar, que sejamos mais semelhantes a Ele no modo de falar e que façamos mais das coisas que Ele fez. Abençôo a vocês, irmãos, para que, ao se esforçarem para ser fiéis, contem com todas as bênçãos do sacerdócio, muitas das quais mencionamos esta noite entre essas mesmas seções de Doutrina e Convênios.
Abençôo as mulheres desta congregação e aquelas ao alcance da minha voz. Gostaria que soubessem como as estimamos, como Deus as estima, e como a bandeira da fé tem sido desfraldada pelas mulheres desta Igreja desde o início. Em todas as gerações, eu diria, desde o princípio dos tempos até o presente momento e no futuro, tantas vezes têm sido as mulheres em nossa vida — nossas avós, mães, esposas, filhas, irmãs, netas — que empunham a tocha da fé e o estandarte da vida virtuosa e carregam os princípios do evangelho para onde quer que ele as leve, seja qual for a provação, até naqueles momentos em menor escala equivalentes à Cadeia de Liberty e nos tempos difíceis. Irmãs, nós as amamos, honramos e abençoamos. Pedimos que todos os desejos justos de seu coração esta noite e para sempre lhes sejam concedidos, e que saiam deste devocional levando firmemente no coração o conhecimento e a compreensão do quanto Deus, os céus e os irmãos que presidem esta Igreja as amam e a alta conta em que as têm.
Saúdo vocês, jovens adultos desta Igreja nesta grande congregação do SEI, e digo que o futuro está em suas mãos. Aqueles da minha geração terão que, num futuro muito próximo, passar o bastão a vocês. Que Deus os abençoe para enfrentarem estes tempos com o valor, a honestidade e a integridade da qual falamos esta noite.
Para encerrar, testifico que o Pai e o Filho vivem. Testifico que Eles estão próximos, e talvez ainda mais próximos, por meio do Espírito Santo, quando atravessamos tempos difíceis. Testifico (assim como testificará o número musical de encerramento, “A Minha Benignidade Não Se Apartará de Ti”, citando o profeta Isaías) que a bondade dos céus nunca se aparte de vocês, a despeito do que aconteça (ver Isaías 54:7–10; ver também 3 Néfi 22:7–10). Testifico que os tempos difíceis também têm fim, que a fé sempre vence, e que as promessas celestiais são sempre cumpridas. Testifico que Deus é nosso Pai, que Jesus é o Cristo, que este é o evangelho verdadeiro e vivo — encontrado nesta que é a Igreja verdadeira e viva. Testifico que o Presidente Thomas S. Monson é um profeta de Deus, o nosso profeta para este momento, para esta época. Eu o amo e o apóio, e sei que vocês também o amam e apóiam. Nas palavras da experiência vivida no templo-prisão da Cadeia de Liberty, meus jovens amigos, “Persevera em teu caminho (...) Não temas (...), pois Deus estará contigo para todo o sempre” (D&C 122:9), em nome de Jesus Cristo. Amém.
NOTAS
1. History of the Church, vol. 3, pp. 190–191.
2. Alexander McRae, A Comprehensive History of the Church, vol. 1, p. 521.
3. History of the Church, vol. 3, p. 290.
4. Carta a Isaac Galland, 22 de março de 1839, Personal Writings of Joseph Smith, ed. rev., comp. Dean C. Jessee (2002), p. 456.
5. Carta à Igreja no Condado de Caldwell, 16 de dezembro de 1838; “Communications”, Times and Seasons, abril de 1840, p. 85.
6. Carta a Emma Smith, 21 de março de 1839, Personal Writings, p. 449.
7. Carta a Emma Smith, 4 de abril de 1839, Personal Writings, pp. 463 e 464; grafia e maiúsculas padronizadas.
8. Ver Comprehensive History, vol. 1, p. 521, cabeçalho do capítulo; ver também p. 526.
9. Ver, por exemplo, “A Choice Seer”, Ensign, agosto de 1986, p. 12.
10. “Text of Address by Pres. Smith at Liberty Jail Rites”, Church News, 21 de setembro de 1963, p. 14; grifo do autor.
11. Tradução livre da 1ª estrofe de “God Moves in a Mysterious Way”, Hymns, nº285 (ver “Deus É Consolador Sem Par”, Hinos, nº 139).
12. Tradução livre da 4ª estrofe de “Nearer, My God to Thee”, Hymns, nº 100 (ver “Mais Perto Quero Estar”, Hinos, nº 62); grifo do autor.
sexta-feira, 4 de março de 2011
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