sábado, 16 de maio de 2009

Jornada Rumo à Retidão

Jornada Rumo à Retidão (A. Lynn Scoresby, A Liahona, ago/1980, p. 9)

Primeiro, achei que fosse uma lista de verificação de atividades. Depois, concluí que se tratava de apenas eliminar o pecado. Então, fiz minha grande descoberta...

Eu tinha dezoito anos – e estava matriculado num curso sobre o Livro de Mórmon na Universidade de Brigham Young – quando me dei conta de que não sabia se o evangelho era verdadeiro. Chegar a essa conclusão já foi um choque, uma vez que eu já obtivera todos os certificados de reconhecimento e mérito, era extremamente ativo em todo tipo de atividades da Igreja, e sempre presumira que a Igreja fosse verdadeira. Presumir, porém, não é saber.
Destarte, por ser obediente, apliquei as instruções contidas em Alma 32 e Morôni 10:4-5, e recebi a certeza de que precisava.
Meu objetivo aqui é simplesmente compartilhar minhas experiências e os conhecimentos adquiridos na tentativa de viver o evangelho. O desenvolvimento espiritual de qualquer indivíduo é, logicamente, um assunto pessoal. Ninguém mais terá minhas exatas experiências ou emoções. Mas parece-me que certos princípios ou conceitos são universais e que minha experiência poderá ser útil para alguns.
Fase um: a questão
O testemunho que havia recebido do Senhor através do Espírito Santo era o bastante para me fazer desejar a retidão. Eu fizera a pergunta certa – o que é retidão? E então, parti para a resposta com algumas premissas erradas. Não havia compreendido as ramificações do testemunho que recebera – primordialmente, que esse testemunho era uma poderosa prova da existência de um Deus pessoal que se importa comigo. Esse simples fato, porém essencial, escapara-me, de algum modo. Eu ainda via a oração como um meio de obter bênçãos, e não como veículo de comunicação com Deus. Aprendi, desde aí, que orar objetivando comunicação com o Espírito do Senhor é um propósito muito mais legítimo do que orar para obter bênçãos – que é essa comunhão operando em nós que nos torna melhores, e não a bênção.
Fase dois: retidão é cumprir simplesmente todos os deveres na Igreja?
Eu achava que retidão era nada mais nada menos que fazer tudo o que meus líderes na Igreja me pedissem. Creio que considerava a retidão como um sistema, um conjunto de regras. Fiz disso, portanto, minha meta, e comecei. Fiz missão, casei-me no templo, fui quase que imediatamente depois ordenado um sumo sacerdote e chamado como conselheiro de bispado, e ocupei muitas outras posições, posteriormente. Procurei freqüentar regularmente o templo, aprender a fazer e cuidar de minha genealogia, realizar noites familiares, pagar dízimo e ofertas, contribuir para os fundos de construção e orçamento, e, em suma, fazer tudo o que meu bispo pedisse.
Não posso negar que as recompensas dessas atividades eram grandiosas. Mas também não posso afirmar que me tornei um espelho de retidão como resultado disso. Eu continuava perturbado por sentimentos de culpa e indignidade. Ainda conservava pequenos defeitos de caráter, e outros males em minha alma. As atividades na Igreja, por si só, não pareciam erradicar meus pecados.
Minha primeira reação, ao perceber que meus esforços não me livravam de meus pecados, foi redobrar meu empenho. Descobri-me mais e mais preocupado em conseguir certo reconhecimento de sucesso na Igreja. Como muitos de nós, presumi, erroneamente, que o chamado para posições elevadas na Igreja significava o selo de aprovação do Senhor. Passaram-se vários anos antes que me livrasse desse engano.
Outro resultado de minha meta voltada à “atividade” – fazer tudo o que pudesse, na Igreja –, foi o fato de me sentir frustrado e culpado, às vezes, porque não podia compreender todas as instruções que recebia dos líderes. Por vezes ouvia: “Faça isso; é o mais importante.” Em outra ocasião, parecia que outra coisa era prioritária. Quando me sentia espremido entre duas coisas “boas”, minha meta de fazer o que me pedissem não me ajudava a tomar as decisões difíceis. A frustração e a culpa se apoderavam de mim, quando descobria que não tinha tempo suficiente para cumprir sempre, e satisfatoriamente, todas as responsabilidades familiares e eclesiásticas.
Com o tempo, descobri algumas coisas importantes. Primeiro, compreendi que, embora minha meta – a retidão – ainda permanecesse, eu me enganara nos métodos para obtê-la. Procurara a evidência exterior, em vez da certeza interior, advinda de meu Pai Celestial. Vi também que satisfazer todas as expectativas de outras pessoas não só era impossível, como também não me fazia sentir totalmente justo e reto. Assim sendo, comecei outra vez.
Fase três: eliminar o pecado, por si só, é retidão?
Sorrio um pouco, quando me recordo de minha segunda tentativa. Descobrira que retidão tinha algo a ver com eliminar todos os pecados que estava abrigando, e assim, decidi, simplesmente, parar de pecar. Ora, eliminar os pecados não é tarefa fácil nem divertida. Os métodos que empreguei me parecem agora quase embaraçosos. Não obstante, eu estava sendo sincero.
A fim de livrar-me dos pecados, descobri que tinha de saber quais eram. Comecei a comparar-me com os outros. Não demorou muito até eu achar que não era tão mau assim, afinal de contas. De fato, comecei a gostar da coisa. E enquanto me concentrava nas faltas alheias, minha culpa e frustrações realmente pareciam diminuir. Assim, não funcionou. Por algum tempo, consegui fingir que não precisava, de fato, modificar-me, mas não pude conservar tal ilusão. Minha consciência não me permitia sufocar por completo os meus pecados.
Fui mais cauteloso na segunda tentativa de identificar meus pecados. Refleti sobre o que era e o que não era pecado. Descobri que estava apenas adiando alguma ação prática; e vi que seria possível, realmente, tornar-me mais objetivo acerca de quem eu era, e em que precisava modificar-me.
Pude ver que tentara racionalizar meus pecados, achando que muitas das advertências das escrituras e dos profetas modernos não se aplicavam a mim. Pensando dessa forma, pusera-me acima dos outros. Mas, logo que pude, honestamente, reconhecer meus pecados, fiquei menos temeroso – e quase desejoso – de eliminá-los.
De imediato, projetei um programa para eliminar meus pecados. Meu programa resumia-se em dizer a mim mesmo que não iria pecar – não teria pensamentos impuros; nunca mentiria; nunca procrastinaria; não perderia a calma. Foram precisos muitos fracassos e retomadas de caminho para descobrir mais duas coisas importantes. Primeiro: quando eu tentava evitar o pecado e tinha sucesso, recebia sempre um sentimento cálido confirmador do Espírito Santo. Segundo: descobri que algumas coisas nas quais procurava não pensar vinham-me à mente com mais freqüência.
A maior parte do problema, a essa altura, conforme percebo agora, é que eu encarava meus pecados como uma espécie de competição – eles contra mim. Achei que tinha de lutar para combatê-los, e que a retidão era obtida à custa de força de vontade. Tal perspectiva apenas perpetuava a situação. Meu problema a essa altura era minha perspectiva. Eu tentava não fazer coisas negativas, em vez de tentar fazer coisas positivas. Em vez de definir meus pecados, deveria ter tentado definir os atributos que eu queria ter.
O resultado dessa tentativa de obter retidão, por conseguinte, foi que a maior parte de meus pecados ainda permanecia comigo, e um ou dois estavam piores do que quando comecei. Acabei considerando-me um completo fracasso.
Fase quatro: aceitar o “status quo”, ou as coisas como são
Minha próxima reação foi tão ineficaz quanto as outras. Perdi as esperanças. Decidi que precisava aceitar a realidade – aceitar o fato de que não me conseguia modificar –, e então tentar ser o mais honrado possível, dentro dessas condições. Concluí que não poderia mudar o bastante para ser uma pessoa celestial. Mas o verdadeiro problema era que eu não aprendera como me modificar.
Essa foi, provavelmente, a época mais infeliz de minha vida. O hábito de ser ativo na Igreja estava tão arraigado em mim que não deixei de participar. Em vez disso, descobri que cumprir mediocremente as designações da Igreja é extremamente fácil. Realizava minhas visitas de mestre familiar, por exemplo, regularmente – porém, no final do mês e de modo bem descuidado. Durante os serviços de adoração, minha mente vagava. Na aparência, eu fazia tudo direitinho, mas, por dentro, sentia-me mal a respeito de mim mesmo, certo de que Deus já não podia amar-me nem me amava. Abandonara toda esperança de algum tipo de recompensa após a mortalidade.
Quase todos nós passamos por esse tipo de sentimento, em algum grau, durante a vida. Tememos a desaprovação advinda do afastamento total da atividade na Igreja, mas, ainda assim, descobrimos meios de resistir ao compromisso pleno e honesto. Tornamo-nos um “água morna”. Por exemplo, podemos lecionar na Escola Dominical, mas nunca levamos a sério a lição. Aceitamos algumas designações do programa de bem-estar apenas porque não conseguimos encontrar uma boa desculpa. Descobrimos falhas nos oradores, líderes ou naqueles que nos parecem hipócritas. Nossas orações tornam-se mecânicas e rotineiras. Consideramos a Igreja como algo que nos tenta controlar – uma instituição grande e complexa que emite pressões e mensagens e nos incute remorsos. Afastamo-nos dos outros, e fazemos segredo da maior parte de nosso sentimento de culpa e frustração.
Nunca disse a ninguém que me sentia assim. Sei que minha vida tinha pouca direção.
Fase cinco: descoberta
Mas eu não poderia tolerar essa melancolia e solidão indefinidamente; sempre fora uma pessoa feliz. Minha solidão levou-me a concluir que só eu, e ninguém mais, era responsável pelo desenvolvimento de minha vida espiritual.
Quando descobri que a auto-estima era mais importante que as opiniões dos outros, vi-me, de repente, livre para fazer uma série nova de escolhas. Durante o tempo em que minha auto-estima dependia das opiniões alheias, eu não tinha liberdade para decidir o que deveria e o que não deveria fazer. Não tinha liberdade de escolher – ou mesmo compreender – a retidão, uma vez que decidira a priori tratar-se de um conjunto complexo de critérios exteriores a que eu tinha de me submeter.
Mas a verdadeira liberdade de escolha, segundo descobri, veio somente quando consegui encarar-me como um filho de Deus, ímpar, singular, responsável pela promoção de meu próprio bem-estar eterno. Descobri, também, que esse tipo de interesse por si próprio não é egoísmo. Somos egoístas somente quando negamos igual interesse aos outros.
Pode haver mais de uma razão para as coisas que fazemos ou dizemos. Um ato de solidariedade pode ser motivado tanto por egoísmo como pelo desejo de satisfação ou felicidade resultante da prestação de serviço. Isto não quer dizer que o que serve seja egoísta. Fazer algo justo só porque o faz sentir-se bem não é um mau motivo.
Fase seis: os princípios da verdadeira retidão
Armado dessas experiências e entendimento – a lembrança de minha desolação e o sentimento de que me poderia modificar –, voltei a ponderar o que seria a retidão. A lembrança da mensagem do Senhor para mim, enquanto fazia o curso sobre o Livro de Mórmon na Universidade Brigham Young, reavivou-se. Aprendera, naquela época, que o Livro de Mórmon era divino, mas a simples conclusão de que Deus existia era-me agora muito mais significativa. Eu havia perguntado, e ele me revelara sua existência.
E por que essa descoberta foi tão importante? Porque conhecer a Deus é o alicerce da retidão. (V. João 17:3.) Deus se nos revela porque nos ama, e também para que possamos tornar-nos como ele é.
Eu não compreendera que a natureza de Deus era igual à minha, e que, portanto, eu possuía o poder intrínseco de me refinar. (V. D&C 58:28.) O Salvador disse: “... o reino de Deus está entre vós.” (Lucas 17:21.) E também disse: “... Buscai primeiro o reino de Deus...” (Mateus 6:33.) Aprendi que devo esforçar-me até conseguir criar essas condições de retidão dentro de mim.
E pareceu-me que a coisa mais bela e radiosa que descobri, ao aproximar-me do Senhor, foi a paz de espírito, o envolvente amor proveniente da comunhão com ele. Antes, o desejo de obter tal comunhão raramente fora motivo de algo que eu tivesse feito. Mas agora, afinal, eu encontrara uma medida infalível para a retidão.
Meu valor e progresso, então, não seriam mais avaliados por minha fama, riqueza, poder ou até mesmo popularidade, nem por quaisquer outros padrões insatisfatórios, por mais estimados ou aceitos que fossem. Meu valor seria determinado pela freqüência com que o Espírito Santo me revelasse que eu conseguira tornar-me um pouco mais semelhante ao Pai. A verdadeira retidão, eu descobrira, era aprender a respeito de Deus e tornar-me semelhante a ele.
Depois de identificar, mediante estudo, algumas das características de nosso Pai Celestial, descobri três passos para tentar adquiri-las, a fim de tornar-me mais semelhante ao Senhor.
Primeiro, aprendi que precisava exercitar, sem qualquer pressão externa, meu livre arbítrio para escolher agir ou pensar como meu Pai Celestial deseja que eu aja ou pense. Era uma escolha consciente, um esforço – porém, algo que eu queria fazer; não uma luta ou peleja. Depois, minha escolha devia ser seguida pela ação. E a terceira parte era a comunhão com o Espírito Santo, o testemunho de que minha escolha era boa, evidência de que eu estava fazendo progressos e confirmação de que meu Pai Celestial me ama.
Permitam-me dar-lhes um exemplo. Minha primeira tentativa de tornar-me como o Pai Celestial foi procurar controlar meu humor. Observei que, ocasionalmente, voltava para casa do trabalho cansado e infeliz. Quando introduzia esses sentimentos em casa, não me portava como bom marido e pai. Decidi que me tornaria mais semelhante ao Senhor se regressasse diariamente ao lar alegre e comunicativo. Escolhi livremente – e quis – tentar fazer isso. Agi, após a escolha, e descobri, pela experiência, que podia modificar meu humor. Um pequeno “truque” que idealizei foi escolher um edifício localizado a cinco metros de casa. De regresso, após o trabalho, aquele prédio era o sinal para eu voltar meus pensamentos para minha família e a vontade de estar com ela. Recordava, conscientemente, horas agradáveis brincando com meus filhos ou passadas em companhia de minha mulher. Ou então revia mentalmente as alegrias de pai e marido. Esse procedimento foi útil para mim. Agora consigo, quase sempre, chegar bem disposto em casa. E tenho sentido a aprovação do Senhor por meu esforço, uma tremenda motivação para tomar outras decisões e agir, com o intuito de tornar-me mais semelhante a Deus.
À medida que cresceu o desejo de tornar-me mais semelhante a Deus, esses três passos rumo à retidão causaram uma mudança radical em minha maneira de encarar as responsabilidades eclesiásticas, familiares e pessoais. Em vez de visitar as famílias só para me livrar da tarefa mensal, vejo-me agora querendo visitá-las, porque sei que isso me ajudará a desenvolver características divinas. A motivação é forte – eu cresço e as pessoas que ensino também são beneficiadas. Em vez de pensar que o cumprimento de todas as designações da Igreja se equipara à retidão, compreendo que os programas da Igreja são apenas um dos melhores meios para se praticar os traços que desejamos desenvolver em nosso caráter – um deles, é claro, o de aprender a amar e servir ao próximo. Em vez de comparecer à reunião sacramental por causa do hábito ou por medo da desaprovação, vou sabendo que ali desenvolverei minha habilidade de comunicar-me com o Espírito do Senhor.
A família é, provavelmente, o ambiente mais importante para nos ajudar a criar uma personalidade semelhante à de Deus. Senti uma mudança de atitude quanto a isso, também, de uma tendência de ver os filhos como objetos de obrigação de amor, para a consciência de que a família é a melhor fonte de crescimento e alegria que posso ter, e o melhor local para se ajudar os outros a descobrirem o regozijo e a verdadeira identidade. Sinto necessidade de saborear cada momento de ensino, de riso, de amor, de trabalho e de crescimento mútuo.
Mudou minha perspectiva quanto a meus pecados e minha luta para eliminá-los. Já tenho experiência suficiente nesse processo rumo à retidão para saber que meus pecados desaparecem quando os substituo por um traço de caráter semelhante ao do Pai Celestial. A energia que usava para conter a ira, por exemplo, posso agora empregar em ser gentil, e, após a escolha, agir de acordo. A ira desaparece simplesmente porque não há mais lugar para ela. Estou mais interessado em ensinar e amar.
Os que me conhecem melhor – eu mesmo, especialmente – não poderiam afirmar que consegui algum estágio notável de retidão. Fico frustrado quando descubro uma escolha que me traria alegria, mas que, infelizmente, não consigo pôr em ação. Estou certo de que outros já efetuaram a mesma descoberta. Mas já experimentei a alegria e a força que acompanham a bênção de, pelo menos, estabelecer a meta certa.
No último dia, suspeito que Deus me fará duas perguntas. A primeira, “O que você fez?”, será mais fácil de responder. À segunda, “Quem você se tornou?”, espero sinceramente responder “Alguém semelhante a ti”.
A. Lynn Scoresby, psicólogo e diretor do “Rocky Mountain Family Institute”, é professor da Escola Dominical na Ala 1 de Highland, Estaca Alpine, Utah.

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